quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Aquela carta...

  O mundo mudou. As cartas não precisam de remetente, os prédios cobrem-se com espelhos e dispensam janelas, o ar não é mais natural, mas condicionado, as músicas só precisam de letras e quaisquer acordes formam melodias. Você mudou. Agora, camufla-se numa sociedade depreciativa e injusta, faz-se dono de si mesmo e recusa minhas doações sinceras de afagos. Só posso dizer que também mudei. E nesse planeta tão cheio de gente vazia, eu quero fazer-me âncora de cabeça para baixo, pois muito discordo e dessa ideia de prender-me ao chão; tenho mesmo que segurar as nuvens e o céu, mirar o alto, ultrapassar as gaivotas, começar por baixo e elevar-me ao infinito. Aqui, nesse protótipo de masmorra, eu quero metamorfosear-me em fênix, pois nutro incrível admiração por esse ser tão puro, doce e sábio; acho que renascer das próprias cinzas traduz um pouco dos meus ideais e afirma que a morte não existe, é só ilusão. Eu quero prolongar para a eternidade essa vontade louca e deliciosa de escrever, pois nas palavras ponho um pedaço de mim e despejo o peso dos fardos que carrego. E, ah, se o mundo moderno e instável soubesse como a leveza que me domina é confortante! Rasgaria a camisa de força que o prende e leria uns livros de poesia…
  Mas o mundo não sabe. Ele continua preso, agarrado às correntes, escondendo o portal da liberdade de si mesmo. Aqui, nesse canto, eu quero desatar os nós que me mantem refém de um lar contraditório, desigual e infeliz para poder criar asas e planar alturas inimagináveis. Eu quero parar de querer e ser, fazer e tornar-me, tão simplesmente, reflexo dos desejos sinceros e singulares que residem em meu âmago. Enquanto não o faço, olho pela janela e vejo.
  As pessoas mudaram. Hoje não acreditam mais no pote de ouro no fim do arco-íris, esperam a chuva passar dentro de seus respectivos automóveis e escrevem no diário duas vezes por ano. Vi também que meus rabiscos sempre começam com o pronome “eu” e isso talvez signifique que eu procuro loucamente por mim mesma, reforçando os traços da minha personalidade em formação. É que também mudei, estou mudando.
  E, sinceramente, hoje só espero que o mundo encontre as chaves que deixei sob o carpete…

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